Paulo de Matos


Uma vida repleta de turismo


Paulo de Matos continua a dedicar-se a tempo inteiro ao turismo. Afinal de contas, conforme vinca bem «o turismo é como o sacerdócio: ou se gosta ou não se gosta».
O turismo surge na sua vida como corolário da experiência adquirida no primeiro emprego. Emprego que lhe impulsiona a organizar viagens. Estava aberto o caminho para o percurso muito rico de Paulo de Matos.
(falecido)


Após terminar o liceu, Paulo de Matos entra para a Segurança Social a 7 de Setembro de 1947. Pouco tempo depois, no início da década de 50, cinco elementos (dos quais três vieram bater ao turismo) é criada
a Casa de Pessoal na instituição. Cabe-lhe, na direcção, o pelouro recreativo-cultural.
Conhece e torna-se amigo de muita gente. Amílcar Cabral é um deles. Um estudante de Agronomia, que trabalhava igualmente na Segurança Social, que mais tarde iria dar início à guerra colonial em Cabo Verde, de onde era natural. O presidente da instituição era também do arquipélago africano, de cuja gentes recorda as mais gratas recordações.

A semente

Em relação ao seu primeiro emprego, com o seu pelouro, entende por bem dar particular atenção à ocupação dos tempos livres dos trabalhadores. É a primeira semente para árvore do turismo que hoje existe bem constituída e com créditos firmados.
Arranca com excursões em autocarro dentro e para fora do país, com particular incidência na Andaluzia e norte de Espanha. Sempre a preço de custo. É o programador, promotor e acompanhador.

Convite para a escola

Chegamos a 1957. Dada a experiência adquirida, Paulo de Matos é convidado para a melhor agência de viagens da época: a Europeia.
Pede um mês de férias à Segurança Social.
É admitido, em Março desse ano, para o “outgoing” (venda de viagens para o exterior). Inicia, a breve prazo, a programação e acompanhamento de grupos em viagens de autocarro, comboio (a grande virtude da agência) e cruzeiros na Europa.
Era presidente da Europeia Atílio Forte (pai do actual presidente da Confederação do Turismo de Portugal, Atílio Forte), considerado, na altura, um dos melhores especialistas mundiais em viagens e turismo. Paulo de Matos não esconde e orgulha-se mesmo que o seu grande professor foi o dinâmico empresário.
É precisamente nas novas funções que vem à Madeira, pela primeira vez, numa viagem de navio, fretado para vir à ilha por ocasião de um congresso de medicina. Estamos em Abril de 1957 e, segundo se recorda, terá sido a bordo do “Pátria”.
Recorda, com satisfação, o encanto que lhe deixou a Madeira desde a primeira altura que a vê e, sobretudo, com a organização da operação em terra, que havia sido programada, com rigor, por Atílio Forte.

Exposição de Bruxelas

Em 1958 é-lhe confiada a maioria dos movimentos para a Exposição Mundial em Bruxelas, com o aliciante de ser, também, o acompanhador das excursões de dia inteiro à Holanda. Uma missão onde é acompanhado pelo director da Europeia, José da Silva, que, depois do 25 de Abril veio a ser secretário-geral da APAVT. Uma pessoa que lhe deixou gratas recordações e com quem ainda mantém contactos frequentes. Paulo de Matos considera que, depois de Atílio Forte, José da Silva era a pessoa que mais conhecia de “outgoing” em Portugal.
Quanto à exposição tinha uma população turística diária de 200 mil pessoas, recorda. E, por causa dela, nesse ano, vive quase entre duas cidades: Paris e Bruxelas, de onde fazia excursões.
Nos anos seguintes, a sua acção é alargada, pontualmente, ao turismo receptivo e cruzeiros de longo curso.
Paulo de Matos não tem dúvidas em dizer que a Europeia, além de agência de viagens constituía a grande escola do sector em Portugal. Dali sairiam pessoas que montaram e desenvolveram agências de viagens que ainda hoje estão no mercado.
É por tudo isto que o mês de férias solicitado à Segurança Social acabaria por resultar num adeus à instituição. Depois de terminado o período de “descanso” foi lá e disse que não queria mais continuar. Estava a gostar demais da nova actividade.

A Star

Os anos passam. Não muitos. Estamos em 1961. Nesse ano é convidado a integrar o grupo de três técnicos para o arranque da agência Star e havia a intenção de lançar a American Express em Portugal em ligação com uma empresa ligada ao Grupo do então Banco Borges & Irmão (hoje integrado no Grupo BPI).
Para além de Paulo de Matos, criam a nova agência no Largo dos Restauradores o chefe da Europeia, Alberto Rodrigues de Assunção, hoje advogado, e Álvaro Ruas, que estava numa empresa de receptivo em Lisboa.
Segundo recorda, os primeiros tempos servem para pôr em prática o que aprendera na escola Europeia. «Começamos a fazer na Star muito do que realizávamos na Europeia. É óbvio, porque tinha sido a escola.»
Neste primeiro período recorda um grande cruzeiro que organizou pelo Mediterrâneo, com passagem por Itália, Líbano, com excursão à Síria, e escala em Israel e Egipto. Já nesse tempo, para além da beleza dos lugares, enfrenta contratempos na passagem do Líbano para a Síria, com a intervenção de soldados, armados de metralhadoras, que pretendiam ver os passaportes.
Em Alexandria, no Egipto, depois de verem os passaportes começam a chamar fascistas aos portugueses. Desta cidade para o Cairo são mandados parar no deserto por uma força russa. Não obstante considera o cruzeiro um sucesso.

Opção pela Madeira

Entretanto, a Star quer alargar os seus horizontes. Lourenço Marques, em Moçambique, Luanda, em Angola, e Funchal, são alguns pontos escolhidos. Paulo de Matos, que ficara apaixonado pela ilha, não pestaneja e opta pela “pérola do Atlântico”.
Assim, depois dos primeiros anos de implantação da Star, desloca-se novamente à Madeira. Estamos em Dezembro de 1964. A missão é abrir uma delegação da Star no Funchal, o que viria a concretizar-se a 2 de Janeiro do ano seguinte.
O Aeroporto da Madeira abrira no ano anterior e criara condições para a American Express poder começar a canalizar clientes americanos para a ilha. Daí a urgência em ter uma agência na Madeira.
Paulo de Matos diz que é criado um programa que engloba a Espanha continental, as ilhas Canárias e a Madeira. Os americanos entravam na Europa por Madrid, faziam um circuito, que incluía a Madeira, e depois regressavam via Lisboa ao seu país. «Era um programa com muito sucesso. Na Madeira, os clientes ficavam hospedados no hotel Savoy.»

João Carlos Abreu

Nesse período, o Clube de Turismo tem um papel importante ao servir um dos almoços ao grupo. Era uma altura que recorda não existirem praticamente restaurantes na Madeira. Aliás, diz mesmo que é por isso mesmo que o actual secretário regional de Turismo abre a “Romana”. Um restaurante que «foi o grande pontapé de saída da Zona Velha. Diria mesmo que a iniciativa de João Carlos Abreu, que chegou a trabalhar na Star, foi um grande pilar para o desenvolvimento do turismo.»
Quanto aos jantares das excursões aponta que o local escolhido era no calhau do Gavinas, junto ao Lido. Uma aventura. Nessas noites, muitas vezes, havia um cantor especial: João Carlos Abreu. «O João Carlos Abreu manifestou-se como um elemento extraordinário para o turismo, com vocação própria fora do normal.»
Apaixonado pelo destino, as suas gentes e a liberdade que se gozava (o que diz não acontecer no continente), pede para ficar na Madeira. Contudo, disponibiliza-se para efectuar trabalhos esporadicamente noutros locais, se esse fosse o desejo da Star. O que viria a acontecer com frequência em destinos dentro e fora de Portugal, nomeadamente entre 1981 e 1985. Neste período cabe-lhe a liderança da equipa Star no consórcio que, nos termos de contrato e assistência técnica, leva a efeito o levantamento e análise e diagnóstico do sector do turismo em Moçambique. Por outro lado, participa na análise e estudo da estrutura física da oferta daquele país , desde Ponta do Ouro até Pemba.
Daí viria a resultar uma experiência piloto, em Outubro de 1982. E, de certo modo, o lançamento do turismo receptivo, tendo como mercado gerador, fundamentalmente a área regional bem como a promoção de viagens de negócios, em ligação com a Feira Internacional de Maputo.
Paralelamente, desenvolve acções junto da ASI (American Sightseeing International), onde vem a integrar a comissão directiva, e da WATA (World Association of Travel Agencies - Associação Mundial das Agências de Viagens), onde é nomeado, em 1986, governador dessa associação international, para a Europa meridional, no decurso da assembleia WATA, levada a efeito em Lisboa, em Dezembro desse ano.

Escola de Hotelaria

Em relação à Madeira destaque para a acção de Paulo de Matos na vida da Região, além da Star.
É convidado pelo Arq. Carlos Lameiro, já falecido, a integrar o grupo de instrutores que procedem ao lançamento da Escola de Hotelaria e Turismo Basto Machado. Estávamos em 1967. Cabe-lhe, naturalmente, a função de programador e monitor da cadeira de agências de viagens.
Anos mais tarde, em 1975, a convite do presidente da Delegação de Turismo da Madeira, Ribeiro de Andrade, integra o grupo “Ad-hoc” que, entre outras acções, promove o primeiro prolongamento da pista do Aeroporto da Madeira.
Nomeado pela ACIF (Associação Comercial e Industrial do Funchal) é, durante 15 anos, membro e presidente da Mesa das Agências de Viagens.
Em 1979 recebe, em Montereal, o galardão “Timone de Ouro”, concedido pela I.P.R. Tourist.
Um ano depois, em Novembro, é distinguido com a medalha de prata de mérito da APAVT, no decurso do “XXVI Congresso Nacional”, que teve lugar em Fortaleza, no Brasil.
Mais para trás no tempo, em 1965 promove, em conjunto com 16 empresários da Madeira, a criação do Skal Clube da Madeira, que é admitido na A.I.S.C. (Associação Internacional de Skal Clubes), em 10 de Dezembro desse ano. Viria a ser presidente da associação para a organização do “IV Congresso Nacional de Skal Clubes”, que tem lugar no Funchal em Outubro de 1979.

Relativamente à Star, registe-se que integrou o grupo de empregados que, em colaboração com a Soane, adquire a empresa ao Grupo Borges. Estamos em Fevereiro de 1989.
Em 1991 cabe-lhe igualmente integrar o grupo de empregados da Star que funda a Orion - Viagens e Turismo, onde ainda se encontra. A Orion, uma empresa especializada no “incoming” (importação de turistas) tem 14 pessoas a trabalhar no Funchal e duas na delegação do Porto Santo.
Na família madeirense que «honrosamente me integro» serviu ainda a comunidade, também na década de 80, como vereador da Câmara Municipal do Funchal e membro da Assembleia Municipal.
Hoje em dia continua a trabalhar. Vai menos às feiras internacionais de turismo. Diz que, agora, são mais para os jovens.
Não obstante, mantém-se actualizado com toda a panóplia de informação que recebe em casa.

Recorda o tempo em que as feiras de turismo eram feitas com um método que já não se faz hoje em dia. O seu assentava num conjunto de reuniões com um período de 15 dias de antecedência, com contactos porta-a-porta para que a feira tivesse algum sucesso. No seu rol de actuação diz que dedicou sempre especial atenção aos mercados de língua alemã, espanhol e dos Países Baixos, sem descurar, no entanto, os outros.
Como “hobby”, Paulo de Matos teve sempre a pesca e o mar. Um gosto que nasce quando tinha 11 anos, altura em que o pai compra um barco na Fonte da Telha, a cerca de sete quilómetros da Costa da Caparica, perto de Lisboa.
Quando vem para a Madeira é convidado pelo dr. Alivar Cardoso a integrar a direcção do Clube Naval do Funchal. Aí começa com os concursos de pesca Madeira - continente a partir de 1975. E, nesse âmbito, consegue materializar um certo fluxo turístico para o destino Madeira e valorizar o grande recurso que é mar.
Contudo, não quer deixar de sublinhar que o seu hobbie número um é o turismo. «As relações internacionais fascinam-me ao ponto de muitas das amizades que tenho, juntamente com a minha mulher, que me acompanha no meu trabalho, são de vários cantos do mundo.»
Por isso, Paulo de Matos continua a dedicar-se a tempo inteiro ao turismo. Afinal de contas, conforme vinca bem «o turismo é como o sacerdócio: ou se gosta ou não se gosta.»

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